quinta-feira, 8 de julho de 2010

Chamar sonrisal alcoólico de ‘cerveja tipo pilsen’é muita cara de pau!

Opinião: Marcelo Moss

O cervejeiro alemão Josef Groll recebeu dos checos a missão de criar uma cerveja para competir com as pale ales. Aprendeu a fazer maltes claros com os ingleses, mas aprimorou a técnica e criou um ainda mais pálido. Ajudado por um monge, contrabandeou uma cepa de fermento lager de Munique, que facilita a produção de cervejas mais cristalinas. A água local, pobre em carbonatos, cálcio e magnésio, ajudou. Assim como os lúpulos de Zatec (ou Saaz), produzidos na região.
Assim Groll criou uma cerveja de cor cobre, mais clara, cristalina e leve que as concorrentes inglesas, com proeminente sabor de malte, algo adocicada, bem balanceada, marcante e aromática. Claro que ele não imaginava estar criando um estilo. Mas o sucesso foi grande, e sua cerveja foi rapidamente copiada. Todas essas cópias sofreram alterações em razão das matérias-primas, das condições técnicas e dos paladares locais.
Só que, aí, você olha para aquela cerveja ordinária, cor de palha mal alimentada, quase sem cheiro, um simples sonrisal alcoólico que, para ser bebido, precisa ser servido em temperaturas glaciais e nas quais as cervejarias têm a cara de pau de colocar no rótulo "cerveja tipo pilsen" e se pergunta: onde foi que a coisa desandou?
A Alemanha e a República Checa mantiveram-se mais próximas às tradições originais. Na Alemanha, a Lei da Pureza da Baviera impediu o uso de matérias-primas pouco nobres. Na Checoslováquia do pós-guerra, o comunismo inviabilizou a modernização. No resto do mundo, o progresso continuou. Entramos na fase das economias de escala. Nas Américas, principalmente, as cervejarias maiores compraram as menores.
Na década de 1970 poucas cervejarias gigantes, norteadas por baixo custo e muita venda, já dominavam o mercado. Baixo custo significa uso de matéria-prima mais barata (arroz, milho, extratos de lúpulo, açúcar) e de tecnologia para produzir rápido, e não para extrair mais sabores e aromas. Pelo contrário. Para vender muito, cervejas saborosas são verdadeiras dores de cabeça. O importante não é fazer uma cerveja boa, mas uma que não seja ruim. Para cervejas produzidas em escala, vale a regra do segundo turno na política: o importante é ter um baixo índice de rejeição e atrelar o sabor percebido à verba de marketing.
* Marcelo Moss, ex-sócio da Baden Baden e pesquisador de cervejas

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